As queimadas, a seca prolongada e o fenômeno La Niña devem elevar os preços dos alimentos a partir de setembro e outubro, conforme apontam pesquisadores. Isso afeta os produtos básicos da mesa do brasileiro, que costumam encarecer nesse período em todos os anos devido à estiagem, mas, com a intensidade extrema neste ano, os alimentos devem sentir esse aumento ainda mais e em menor tempo. São itens como café em grãos, laranja, soja, carnes, hortaliças de ciclo mais curto, mandioca e cana-de-açúcar.
As pesquisas mais recentes já apontam uma elevação no preço dos alimentos essenciais na mesa do brasileiro, sem contabilizar, ainda, o efeito das queimadas e da estiagem severa. Arroz, café em pó e em grãos e frango registraram aumento em sete das oito capitais analisadas pela pesquisa mensal da plataforma Cesta de Consumo HORUS & Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV-IBRE). Já os produtos que apresentaram queda estão os legumes, frutas e o bovino.
Em agosto, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) apresentou uma deflação de 0,02%, puxada pelos alimentos, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Mas, conforme pesquisadores, esse cenário não deve se repetir nos próximos meses devido aos problemas climáticos extremos.
Queimadas, seca severa e La Niña
O Brasil se tornou o país da América Latina com o maior número de focos de incêndio na última semana, com mais de 70% de focos de calor pelo território. A fumaça das queimadas se espalhou pelos países vizinhos depois de derrubar a qualidade do ar em diferentes estados brasileiros, conforme o monitoramento em tempo real do IQAir.
“É uma combinação de fatores para o aumento dos preços dos alimentos”, explica Matheus Dias, pesquisador da FGV-IBRE. “Nós temos a seca que ocorre todo ano e algumas safras sofrem mais do que outras, que estão no período entressafra. Mas quando olhamos para alguns alimentos que sofrem com a seca, temos o café, a laranja e algumas hortaliças de ciclo mais curto, que sofrem um pouco mais e consequentemente com as queimadas.”
Ele ainda destaca os alimentos em fase de plantio e aqueles que já estão prontos para a colheita, que devem ser impactados. “O café, que tem sofrido bastante; a cana-de-açúcar também, tanto para fins produtivos quanto alimentícios”, acrescenta.
Já o pesquisador do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada da Universidade de São Paulo (Esalq-USP), Renato Garcia Ribeiro, salienta que as queimadas tiveram efeitos pontuais sobre o café. “O que mais impacta em termos de produção foi o clima seco e a falta de chuva desde o mês de abril. O café, desde 2021, sofre com problemas climáticos por conta de geadas, depois em 2022 choveu bastante, mas em 2023 foi um período quente e seco e atrapalhou desde o começo e o final da safra. Agora, a projeção da próxima safra também tem um clima quente e seco que atrapalha esse começo de produção”, explica.
Pesquisadores apontam que as queimadas agravam o período de estiagem e destroem o solo para plantação, além de que a chegada da La Niña pode agravar a situação, o que impacta a colheita do que já está no campo e pode atrasar o início do próximo plantio de grãos, na safra 2024/2025.
Esse fenômeno da natureza, segundo os meteorologistas, deve ter início a partir da primavera, que começa no próximo domingo (22). A expectativa é que ocorra mais chuva na região Norte e mais seca no Sul, ou seja, o inverso do clima habitual.
Por que o preço sobe?
Isso pode ser explicado pela metáfora do “efeito borboleta”, quando um simples movimento de bater de asas pode modificar o rumo de toda uma situação. Assim também funciona, em tese, na cadeia produtiva de alimentos. Com a seca agravada pelas queimadas e a aproximação do fenômeno La Niña, a produção de alimentos é afetada, o que significa que os produtores devem repassar esses custos de produção aos consumidores, e o preço sobe. Nesse cenário, o IPCA fica pressionado.
“Quando entramos no período de setembro e outubro, que vamos deixando o período mais seco de inverno, o que a gente tem é normalmente um aumento de preços dos alimentos”, observa Dias. “É natural ver que a série histórica aumenta entre setembro e outubro. Mas a seca vai fazer com que esse aumento acelere ainda mais.”
Ele traz o exemplo do plantio de soja. Esse item é essencial na cadeia produtiva e qualquer mudança na hora de plantar ou colher pode reduzir a produção e elevar os custos de outros produtos atrelados à oleaginosa. “Se atrasa esse plantio ou tem uma expectativa de que a safra será menor, esse custo é repassado na nutrição do gado e, consequentemente, o produtor irá repassar esse custo também para a carne. Caso a seca continue severa, é esperado que o preço da carne e de outros alimentos aumente”, conclui.
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