Mais de 40 milhões de brasileiros fizeram suas declarações de imposto de renda no ano passado e prestaram contas à Receita Federal. No entanto, nem todos entendem como é feito o cálculo que indica se é preciso pagar ao fisco ou se há restituição a receber. Nesta terça-feira, ganharam destaque notícias sobre o provável aumento da faixa de isenção – a renda mensal até a qual não é preciso nem pagar nem declarar o IR. Mas o que isso significa na prática?
A incidência do Imposto de Renda (IR) é definida por uma tabela progressiva, que é dividida por faixas de valores. Quanto mais uma pessoa ganha, mais ela paga e imposto. Essas faixas vão desde a isenção do IR até uma tributação de 27,5%.
Para 2024, o Governo Federal anunciou que vai reajustar o limite de isenção para dois salários mínimos (R$ 2.824), para se adequar ao valor que foi a R$ 1.412. Contudo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) diz que deseja elevar o limite para R$ 5 mil até 2026, como prometido em campanha.
“A ideia é que essa tabela tenha atualização anual (o que nem sempre acontece, a depender das políticas fiscais e econômicas do País naquele ano), para que o poder de compra do contribuinte não seja prejudicado pelo recolhimento do imposto”, afirma Simone Alves da Costa, professora da FIA Business School.
Como está a tabela atualmente:
Base de Cálculo (R$) | Alíquota | Parcela a Deduzir do IR (R$) |
Até 2.112,00 | isento | isento |
De 2.112,01 até 2.826,65 | 7,50% | 158,4 |
De 2.826,66 até 3.751,05 | 15% | 370,4 |
De 3.751,06 até 4.664,68 | 22,50% | 651,73 |
Acima de 4.664,68 | 27,50% | 884,96 |
Defasagem da tabela do IR
Embora a tabela do IR tenha tido reajuste em 2023, apenas no limite de isenção, as faixas estavam sem um reajuste desde 2015. Segundo Marcelo Lettieri, Diretor de Assuntos Técnicos do Sindifisco Nacional, a não correção das demais faixas fez com que os contribuintes, em termos agregados, pagassem mais IRPF do que no ano anterior.
Além disso, levantamento do Sindicato dos Auditores-Fiscais da Receita Federal calculou a defasagem média da tabela do Imposto de Renda em 149,56%, levando em consideração os resíduos inflacionários acumulados desde 1996 (ano do fim do reajuste automático).
“Isso acontece porque mesmo quando não se corrige a tabela progressiva do imposto de renda pela inflação do período, as pessoas têm o seu salário corrigido. O que faz com que elas paguem mais IRPF, pois elas mudam de faixa de incidência mesmo sem ganho real”, destaca Lettieri.
Ele ainda destaca que uma parte significativa das pessoas que hoje contribuem com 27,5% de alíquota de IRPF sequer pagaria o tributo se a tabela fosse corrigida em sua integralidade.
Segundo cálculos do sindicato, nenhum contribuinte com renda tributável mensal inferior a R$ 4.899,69 pagaria Imposto de Renda. Ou seja, apenas a partir desse valor incidiria a alíquota inicial, que é de 7,5% e a contribuição máxima do imposto alcançaria apenas os indivíduos com renda mensal acima de R$ 12.176,03.
“No universo individual, perde-se o poder de compra, fazendo com que, na prática, sejam necessários mais recursos financeiros para dar conta dos desembolsos mensais, aumentando a carga tributária efetiva a ser paga” ressalta Simone Alves da Costa.
“Pensando em termos coletivos, é um processo que agrava a desigualdade social, fazendo com que, proporcionalmente, os de menor renda paguem mais impostos, além de inibir os investimentos e a produtividade do País”, completa.
Os impactos do reajuste do limite de isenção
Carlos Lopes, economista do BV, aponta que quanto o reajuste da tabela é feito abaixo da inflação, a cada ano que passa mais pessoas passam a pagar IR, pois saem da faixa de isenção.
Por isso, o impacto para a população do reajuste integral da tabela é que todos pagariam menos, e uma parte sequer pagaria Imposto de Renda. De acordo com o Diretor de Assuntos Técnicos do Sindifisco Nacional, se o reajuste fosse na casa dos R$ 5 mil, mais de 29 milhões de brasileiros estariam isentos do IR.
“Assim, o contribuinte tende a ajustar seus desembolsos financeiros em função do recurso que está disponível. A revisão, efetuando as devidas correções, tende a aumentar o poder de compra do cidadão, fazendo com que mais pessoas estejam dentro da faixa de isenção, bem como reduzindo a carga tributária efetiva”, diz a professora da FIA Business School.
Já para o governo, o reajuste integral da tabela, levando em consideração todos os resíduos inflacionários que não foram reajustados desde 1996, implicaria uma renúncia fiscal de R$ 135,8 bilhões, o que representa uma perda significativa de arrecadação.
“Porém, existem medidas, como uma maior tributação do topo da pirâmide social, que poderiam fazer essa compensação. Esta é uma questão central que deve fazer parte da reforma tributária da renda que, esperamos, seja discutida ainda este ano no Congresso Nacional”, destaca Lettieri.
O economista do BV ainda ressalta que na prática, ao não reajustar a tabela do IR, o governo está escolhendo aumentar a base de incidência do imposto. E, que caso ele decida pela isenção até R$ 5 mil, o impacto anual seria de aproximadamente 1% do PIB.