As discussões e ações sobre diversidade e igualdade de gênero no mundo corporativo são cada vez mais frequentes. Contudo, estão longe de estarem resolvidas. Segundo levantamento da Quantum Finance, apenas 31% dos cargos de liderança das empresas de capital aberto no Brasil são ocupados por mulheres.
O estudo levantou dados de diversidade de gênero e cor/raça de cerca de 600 empresas brasileiras de capital aberto, com origem nos Formulários de Referência (FRE) encaminhados pelas próprias companhias à CVM.
Presença de gênero em cargos de liderança
Masculino | Feminino | Não Binário | Outros | Prefiro não responder | |
Total | 54,64% | 37,67% | 0,03% | 0,20% | 7,46% |
Masculino | Feminino | Não Binário | Outros | Prefiro não responder | |
Lideranças | 53,61% | 31,66% | 0,02% | 0,10% | 14,61% |
Masculino | Feminino | Não Binário | Outros | Prefiro não responder | |
Não Lideranças | 54,73% | 38,24% | 0,04% | 0,21% | 6,78% |
Outro dado, segundo o Anuário “ESG Disclosure Yearbook Brasil 2024”, elaborado pela agência de classificação de risco Bells & Bayes Rating Analytics, mostra que 50% das empresas do Novo Mercado da B3 não têm mulheres presentes na diretoria. No conselho de administração, o índice é de 27%.
“A diversidade, entendida como a presença de pessoas tecnicamente habilitadas, com diferentes origens, experiências, habilidades e perspectivas na alta administração, exerce papel fundamental na criação de valor econômico e no impulsionamento da inovação e do desempenho empresarial”, destaca o relatório.
O estudo analisa, por meio de mais de 70 data points, o perfil de 191 companhias listadas e também usou como base as informações das próprias empresas, declaradas no Formulários de Referência enviado à CVM. Um destaque é que 82% das companhias analisadas informaram não possuir, ou não mencionaram, objetivos específicos voltados à diversidade de participantes na alta administração. Na avaliação de Wesley Mendes, principal autor do Anuário, o cenário deve começar a mudar em breve.
“Ao longo dos próximos dois anos, as empresas terão de se adequar a novas obrigações impostas pela B3 quanto à composição da administração, adotando critérios de diversidade ao elegerem os membros da sua alta gestão, indicando ao menos uma mulher (considerada qualquer pessoa que se identifique com o gênero feminino) e/ou um membro de comunidade assumida como sub-representada (assim entendido como qualquer pessoa que seja ‘preta’, ‘parda’ ou ‘indígena’, integrante da comunidade LGBTQIA+, ou pessoa com deficiência), para cargos de titulares do conselho de administração ou da diretoria estatutária.”
A importância da diversidade nas empresas
De acordo com Arlane Gonçalves, CEO da AGC, Consultoria de Cultura, Liderança e Equidade, em primeiro lugar, ter diversidade de gênero nas empresas é o mínimo que precisamos fazer para refletir nelas as identidades que existem na sociedade e no mercado consumidor.
“Todos os grupos sociais, na proporção de suas existências, devem ocupar todos os espaços, especialmente aqueles que significam poder econômico e de decisão”, afirma.
A partir disso, a CEO ainda ressalta que vários estudos demonstram que organizações com mais diversidade de gênero conseguem catapultar mais perspectivas e experiências, o que, através de uma cultura inclusiva e segura, pode levar a soluções mais criativas e inovadoras.
“Estudos acadêmicos e de mercado mostram que equipes diversas têm mais probabilidades de inovar e resolver problemas de maneira eficaz. Além disso, como evidencia a série de relatórios da McKinsey & Company, empresas que se destacam em diversidade de gênero em relação aos seus concorrentes são 25% mais propensas a ter uma rentabilidade acima da média. E esta probabilidade se intensifica ainda mais quando somada à diversidade étnico-racial”, aponta ela.
Outros relatórios, afirma Arlane Gonçalves, também corroboram que a maior presença de mulheres na liderança contribui para alavancar indicadores de produtividade e de operação, além de reduzir rotatividade e o risco reputacional. Mulheres líderes têm maior probabilidade de conectar a estratégia do negócio às práticas ESG, fazendo com que as organizações se orientem intencionalmente para posturas mais sustentáveis.
Para Lina Nakata, uma das responsáveis pela Pesquisa FIA – Lugares Incríveis para Trabalhar e professora da FIA Business School, uma empresa composta por 40% a 60% de mulheres, no total e nos cargos estratégicos, pode contar com produtos e soluções que atendem melhor aos seus públicos, pois o mercado é diverso também.
“Empresas que são diversas também conseguem ser mais criativas, além de contarem com um ambiente de trabalho mais inclusivo e agradável para que todos possam ser quem realmente são” , destaca.
Os principais desafios
Gonçalves aponta que, no Brasil, cerca de 84,5% das pessoas têm pelo menos um tipo de preconceito contra as mulheres, de acordo com estudo recente da ONU. “Então, o primeiro passo é olhar para os estereótipos de gênero e preconceitos inconscientes que aprendemos, reproduzimos e ensinamos. Estes fenômenos, mesmo que não intencionais, influenciam diretamente nossas decisões na hora de contratar, validar, dar oportunidades, reconhecer e promover mulheres”, diz.
Já, uma vez que a mulher está dentro da empresa, há alguns fatores que contribuem para que ela vá ficando para trás, destaca a CEO. Dentre eles, está a ausência de mentoria e patrocínio.
“Aqui, é importante fazer um grande destaque: homens possuem um grande papel na jornada de igualdade de gênero, e eles devem ser nada menos do que agentes de transformação. Mentores e patrocinadores podem ajudar a orientar carreiras, abrir portas e fornecer o apoio necessário para o desenvolvimento de lideranças femininas”, ressalta.
A professora da FIA Business School diz que os desafios são vários, mas divide os pontos de atenção em dois grupos. Como:
1. Atenção corporativa:
- Monitorar melhor a questão, desde entender o sentimento das pessoas, até mesmo se os salários estão sendo equitativos para homens e mulheres;
- Saber se os fenômenos recorrentes no mercado também estão atrapalhando o dia a dia das mulheres, como o mansplaining (explicar o que uma mulher já falou, sem necessidade), o manterrupting (interromper as mulheres quando estão numa reunião), o bropriating (apropriar-se de uma ideia dada por uma mulher, sem dar os devidos créditos), entre outros, para que tudo isso seja evitado.
2. Incentivo
- Apoio para que mulheres sejam incentivadas a buscar os cargos da alta liderança;
- Incentivo à mentoria para que elas possam seguir esse caminho.
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Como os investidores podem analisar a diversidade?
Nakata afirma que os investidores podem analisar as empresas por meio dos relatórios de sustentabilidade, que apresentam inúmeras informações sobre diversidade, equidade e inclusão. Assim poderão entender as composições dos times, suas lideranças, seus conselhos de administração, entre outros elementos estratégicos.
Índices e Certificações também podem ser ferramentas de análise, mas sempre olhados com bastante criticidade, destaca Arlane Gonçalves. “Embora esses sejam mecanismos necessários para avaliarmos o mercado, há uma tendência de que, com o tempo, eles não necessariamente reflitam impactos e ações realmente transformadoras”.
“É super válido também analisar a composição do Conselho Administrativo e da estrutura de liderança. Não tem diversidade de gênero nela? Então está aí um grande ponto de atenção”, alerta ela.
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