A série de eventos climáticos extremos, como as enchentes no Rio Grande do Sul e o aumento intenso das queimadas no Pantanal e na Amazônia, denota um cenário cada vez mais preocupante com relação ao meio ambiente. No mercado financeiro, essas variáveis passam a ser avaliadas como risco de natureza, que já está no radar dos bancos centrais ao redor do mundo. A discussão ganha fôlego em torno de regras mais claras sobre o ESG e mudanças climáticas no aspecto para contabilizar os créditos de carbono e permitir ao investidor analisar o desempenho das empresas nessas atividades.
“Vou olhar todos os dados públicos da empresa para entender se são críveis, como quando a gente levanta o tapete e encontra coisas embaixo, mas temos que avaliar com um olhar regionalizado para ter uma análise correta”, afirma Ana Luci Grizzi, sócia da EY Brasil para Mudanças Climáticas e Serviços Sustentáveis, durante o painel “Clima e seus impactos crescentes nos mercados”, na Expert XP 2024.
Ela chama atenção para a proatividade na tomada de decisões que ajudem o País a liderar a transição da economia verde de baixo carbono, uma vez que o Brasil possui vasto potencial energético. “Temos que mostrar o que o Brasil é forte do ponto de vista ambiental. Não somos as queimadas no Pantanal e na Amazônia, podemos liderar os avanços na sustentabilidade. Precisamos mudar esse discurso”, ressalta.
Grizzi enfatiza, ainda, que existe conexão entre os eventos climáticos extremos e choques econômicos na sociedade. “Se a gente olhar os riscos, como a enchente no RS, a gente faz as conexões de um risco sistêmico que acaba caindo no mercado financeiro, por conta da inadimplência.”
Mais 136 mil consumidores ficaram inadimplentes em julho deste ano, segundo dados da Serasa. No total, são 72,66 milhões de brasileiros em situação de inadimplência.
“As mudanças climáticas nos deixam mais vulneráveis aos choques econômicos, como no RS”, observa Ricardo Harris, chefe de gabinete do diretor de regulação do Banco Central.
“Temos que sair do complexo de vira-lata quando formos discutir mudanças climáticas, porque é um problema de todos”, afirma Anibal Wadih, fundador e sócio-gerente da GEF Capital Partners. “Precisamos aproveitar os benefícios econômicos. Tenho que considerar risco físico. Se tenho uma posição no Sul, tenho que colocar no Norte, também. Vamos resolver as mudanças climáticas com o capitalismo que precisamos.”
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Como atrair mais investidores?
Para trazer mais investidores estrangeiros para o Brasil, Viviane Romeiro, especialista e consultora em mudança do clima e sustentabilidade, destaca a importância de ter regras claras sobre as práticas ESG e as medidas de mitigação às mudanças climáticas.
“Acabar com a incerteza regulatória ajudaria a atrair mais investidores. É fundamental ter regras claras. Essas grandes tragédias decorrentes de eventos extremos nos fazem olhar para a tarefa de casa que precisamos fazer”, diz.
Segundo ela, o investidor estrangeiro analisa o relatório de empresas do exterior sobre essas medidas ambientais e, ao olhar para as companhias brasileiras, precisa encontrar o mesmo padrão de informações e transparência com o objetivo de sentir segurança e confiança para investir.
Romeiro ainda ressalta a janela de oportunidades que se desenha nos próximos anos. “Temos a COP30 no ano que vem, uma janela de oportunidade, começando pelo BRICs e G20, para atrair esse financiamento climático.”
“O investidor vai ter que estudar muito para entrar nesse segmento”, afirma Rodrigo Favetta, CFO do Pacto Global da ONU no Brasil. “Apesar da gente ter algumas regras, não há algo unificado. É preciso ter certa vivência para perceber se faz ou não sentido [alguns dados nos balanços das empresas]. Quanto mais a gente fomentar esse conhecimento e essa importância da sustentabilidade, acho que certamente essa história terá um final feliz.”
Regulação
O ambiente de regulação avança no mercado financeiro brasileiro. Exemplo disso é a nova regra adotada pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) que passou a exigir informações ESG no formulário de referência das empresas listadas na Bolsa de Valores. Porém, os critérios de padronização, transparência e comparabilidade entre ativos ainda carece de mais avanços, segundo Nathalie Vidual, superintendente de orientação aos investidores e finanças sustentáveis da CVM. A fala ocorreu durante a roda de conversa “Brasil e finanças climáticas: o papel da regulação”, no evento da Expert XP 2024.
“O aumento da regulação sobre as finanças sustentáveis em sua forma geral vem justamente cobrir essa demanda. Os investidores precisam de prestação de contas e relatórios mais objetivos. É para o capital privado se sentir seguro para migrar para esses ativos. A regulação vem para sanar essa demanda dos investidores por mais informação”, ressalta.
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A CVM e o Banco Central, entre outras instituições do mercado e o governo, trabalham na formulação de uma taxonomia verde, que visa dar mais clareza às atividades sustentáveis e transparência. “O Banco Central também participa da discussão em torno da taxonomia. Outro papel é sobre o programa Eco Investe Brasil, para permitir a transição para a economia de baixo carbono”, afirma Harris.
A implementação das medidas também implica em mais custos, de acordo com Jessica Bastos, diretora da Susep — Superintendência de Seguros Privados do governo federal. “A gente entende que existe um custo para adotar os novos padrões e entendemos que há uma mudança constante nas normas, que estão sempre em evolução. É uma mudança enorme na cultura do segurador para ser mais rigoroso com seu cliente. A gestão desses riscos é difícil porque a partir do momento em que há regras claras, as cobranças reputacionais e de imagem de responsabilização jurídica é maior.”
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