A Super Quarta (nome dado quando as decisões de política monetária do Fed e do Copom caem no mesmo dia) não tem muito de super nesse mês de março. As decisões das autoridades monetárias dos Estados Unidos e do Brasil são amplamente esperadas pelo mercado e há pouco espaço para surpresas. O Copom deve reduzir a Selic, taxa básica de juros, em mais 0,5 ponto porcentual, mesmo ritmo desde o início do afrouxamento, em agosto. Já o Fed deverá manter mais uma vez as taxas de juros no patamar entre 5,25% a 5,50%.
Não há na Faria Lima ou em Wall Street muita tensão sobre esses números. Por outro lado, os comunicados emitidos pelos dois bancos centrais serão analisados na lupa.
No Brasil, inflação ainda não é batalha vencida
No Brasil, há uma discussão sobre se o BC irá manter seu foward guidance como nas últimas decisões. Em janeiro, o comunicado dizia: “Em se confirmando o cenário esperado, os membros do Comitê, unanimemente, anteveem redução de mesma magnitude nas próximas reuniões e avaliam que esse é o ritmo apropriado para manter a política monetária contracionista necessária para o processo desinflacionário”. Agora, a dúvida é sobre o plural usado “nas próximas reuniões”.
“Isso vem engessando um pouco a atuação do BC, ele praticamente se compromete a reduzir a Selic nas próximas reuniões”, diz Julio Hegedus, economista-chefe da Mirae Asset. Segundo ele, seria positivo a autoridade monetária retirar essa sinalização, para ter mais liberdade nas próximas decisões, a depender dos dados de inflação e atividade econômica.
O economista lembra que apesar de a inflação não estar mais tão elevada quanto antes, o combate a ela ainda não terminou: as expectativas para 2024 e 2025 ainda estão acima da meta, o índice de difusão segue elevado e o núcleo (medida que acompanha os itens menos voláteis da inflação) está em um patamar desconfortável.
Também com a expectativa de manutenção do ritmo de cortes em 0,5 ponto porcentual, Leonardo Cappa, economista-chefe da Traad, aponta que a Selic iniciará o segundo semestre abaixo de dois dígitos, em 9,75%. Se as expectativas para a inflação em 2025 não começaram a cair, ele vê pouco espaço para cortes além desse patamar.
“A cada reunião, aumenta o peso que o Bacen dá para a inflação do ano seguinte. Essa já foi uma mudança no último comunicado, em que o BC contextualizou um pouco mais o peso da expectativa de inflação de 2025”, diz.
Apesar de a expectativa para a inflação oficial não esteja distante da meta (atualmente, o boletim Focus projeta IPCA de 3,51% em 2025), Cappa ressalta que ainda há riscos. “Os preços dos alimentos estão ajudando mais [na queda da inflação], mas ainda acho que o mercado de trabalho vai continuar aquecido, e a renda disponível [das famílias] vai permanecer em nível elevado”, afirma. No entanto, ele diz não esperar mudanças no último parágrafo do comunicado.
Maykon Feitosa, economista da Highpar, concorda que o menos importante é a decisão em si, mas diz imaginar que o comunicado evidencie a volatilidade do cenário, em especial o externo. Segundo ele, o BC pode tirar a parte do comunicado em que diz ver cortes nas próximas reuniões. “Não que tenham deixado de acreditar no cenário de referência ou que tenha surgido alguma novidade, mas para não se comprometer e manter graus de liberdade para avaliar os dados à frente”.
Nos EUA, Fed ainda quer mais dados para iniciar corte de juros
Os Estados Unidos têm um cenário similar ao do Brasil, avalia Hegedus, da Mirae Asset. “A decisão ainda está subordinada aos indicadores, o início do corte pode ser em junho ou ao longo do segundo semestre. [O Fed] tem que se convencer realmente que a economia está em um soft landing, mas os dados ainda não mostram isso, mostram a economia ainda aquecida”, diz. “Nada está fora do controle, mas o Banco Central é cauteloso por natureza”, afirma.
Leonardo Cappa, da Traad, ressalta que dados fortes do mercado de trabalho e de inflação ao consumidor fizeram o mercado convergir recentemente para um cenário de menos cortes de juros em 2024. “O mercado de trabalho ainda é forte, e há alguma expectativa de se o cenário do Fed vai mudar para só dois cortes [em 2024]”, diz.
“O Fed não gosta de dar surpresas, se fosse cortar em março, em janeiro já teria sinalizado, e tinha que estar muito melhor a situação de inflação”, diz Cappa. O cenário se mantém. Segundo ele, para que a autoridade monetária viesse a cortar em junho, já daria sinais mais claros agora. “O problema é que os dois últimos dados de inflação vieram mais altos do que o esperado”.
Além do comunicado, o economista diz que o mercado estará de olho na entrevista de Jerome Powell, após a divulgação da decisão.
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